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Há dias bons e dias maus. Ponto final. Parágrafo

Há dias bons e dias maus. Ponto final. Parágrafo

17
Set23

Celebro este dia de setembro, que na minha cidade está cinzento, de forma tranquila, a ler quem gosto

Maria Pinto

Não é em setembro que se inicia o ano, mas é um mês de início, de transição, de algo que acaba e outro algo começa.

Não tenho redes sociais e, habitualmente, é ao domingo que me perco pelo mundo da blogosfera e, gosto. Aprendo, ouço opiniões diferentes das minhas, comentários que eu própria faria a diversos temas e dá-me assim uma espécie de pertencer a uma tribo de pessoas, umas mais terrestres que outras, mas que me dá uma certa sensação de irmandade. Não sei bem se é este o termo!

Passei na Maribel Maia e os seus posts pedagógicos e autênticas lições e mais uma vez o setembro a rondar o início do ano letivo.

Passo no Merlo e que fala na tristeza das nuvens cinzentas e deste mês em que o sol vai rareando. Já a Isabel Silva a mostrar fotos de vários céus, mesmo os cinzentos com as nuvens fofas deste mês.

Passo no masparaqueraioqueroeuumblog e percebo que o desfazer as malas é muito mais do que tirar a roupa de uma mala. E espero que o cruzeiro da greeneyes seja extraordinário, neste setembro que, para alguns, ainda sabe a férias.

Na escritaesquisita, o elogio e o protesto, na alien, o rapto dos bloggers…as férias a passarem e as pessoas a não voltarem…a Di fala do afeto do coração (os laços não são só os de sangue) e digo eu, também podem ser laços com pessoas que não conheço mas que leio…

Nos lados AB, a chuva e a sua necessidade para a agricultura…e na cor azul dos miosótis, o poema sombrio, como são estes dias sombrios de chuva de setembro.

Ri-me muito com a gata christie e as suas limpezas de casa e de vida e de passado, como o setembro se impôs numa casa, verdadeiramente, que deixa a infância um pouco mais para trás…porque o tempo corre mesmo e quase nem damos por isso. E os parabéns na cor da escrita, por mais um aniversário do seu filhote.

A greenideas mostrou-me a cara com que vou ficar amanhã, uma segunda de setembro!

No cúmplice do tempo, os seus poemas e que são experiências de palavras para ler e para ouvir.

E, finalmente, nas comezinhas, com o seu tom acutilante para os outros e com o mesmo tom de gozo próprio por uma licença de casamento, que passou ao lado.

Setembro é, para mim, sinónimo de um novo recomeço, o início do ano letivo, o entusiasmo e dos olhos remelosos, o princípio da queda das folhas que se vão matizar nas próximas semanas, trazendo-me a minha época do ano favorita, o outono. É um adeus a algo quente e bom para um olá a outras rotinas, a horários mais rígidos e a mais solicitações. Mas com a queda das folhas vem também a esperança do futuro, a acontecer… Daqui a nada é Natal e com um pouco de esforço avizinha-se um novo ano gregoriano. Tudo passa tão rápido. Tudo. As férias, a idade dos filhos, a sua infância e a vida. Aproveitemo-la no presente. Porque mesmo que uns dias sejam cinzentos, outros virão, mesmo no outono ou no inverno em que veremos um sol esplenderoso!

E celebro este dia de setembro, que na minha cidade está cinzento, de forma tranquila, a ler quem gosto.

10
Set23

Apenas para me lembrar que a vida dá muitas voltas

Maria Pinto

Hoje é dia 10 de setembro, o 253.º dia do ano no calendário gregoriano e faltam 112 dias para acabar o ano.

Fazendo uma pesquisa acerca do dia, dei comigo impressionada com alguns acontecimentos…mencionando apenas alguns:

1509 -Um sismo conhecido como "Pequeno Juízo Final" atinge Constantinopla. E ainda ontem mais de 500 anos após, um sismo abalou e bem parte de Marrocos e redondezas e infelizmente tastas pessoas morreram ou ficaram feridas!

1721 - Tratado de Nystad: fim da Grande Guerra do Norte entre a Rússia e a Suécia. Como eu queria que a guerra entre a Rússia e a Ucrânia acabasse…

1756 - O rei José I de Portugal assina a Lei que estabelece a primeira região demarcada no mundo para a produção de vinho – o vinho do Porto e cria a Companhia Geral da Agricultura das Vinhas do Alto Douro com sede na cidade do Porto. E o vinho do Porto continua a ser mundialmente conhecido e, agora, a minha querida cidade, é um destino turístico de primeira escolha (com tudo o que isso tem de bom e de menos bom)

1898 - A imperatriz Elisabeth da Áustria, Sissi como era conhecida, é assassinada…uns anos mais tarde pela morte de outro imperador, inicia-se a primeira guerra mundial e em 1919, neste mesmo dia, a Áustria e os Aliados assinam o Tratado de Saint-Germain-en-Laye reconhecendo a independência da Polónia, Hungria, Checoslováquia e Jugoslávia. Alguns destes países já nem existem com esta nomenclatura, em cerca de 100 anos…

1937 - Nove nações participam da Conferência de Nyon para tratar da pirataria internacional no Mar Mediterrâneo. Passados 86 anos o que preocupa no mar Nostrum não é a pirataria, ou melhor, até há pirataria… milhares de pessoas a morrerem numa tentativa vã de chegar à Europa, para melhores condições de vida…dando dinheiro para fazerem uma viagem de barco, que frequentemente é fatal!

1943 - Segunda Guerra Mundial: No decorrer da Operação Achse, as tropas alemãs iniciam a ocupação de Roma. Mais de 2000 anos antes eram os romanos a conquistarem o mundo e a alargarem o seu império

1960 -  Nas Olimpíadas de Verão em Roma, Abebe Bikila torna-se o primeiro africano subsaariano a ganhar uma medalha de ouro, vencendo a maratona com os pés descalços. Pés descalços. Absolutamente incrível e, atualmente, nas provas de meio e longo fundo, os africanos dão cartas e bem

1974 - Guiné-Bissau fica independente de Portugal. Pergunta minha…O que fomos nós fazer na guerra de Ultramar? Teria de ter havido guerra? Não poderia passar só por acordos económicos/sociais e de parceria? O meu pai foi ferido em Moçambique…que sentido faz qualquer guerra?

2022 - Carlos III é oficialmente aclamado como Rei do Reino Unido e todos os países membros da Commonwealth. Não me interessa a realeza, mas fiquei perplexa…já passou um ano?

Não fui ver os acontecimentos do dia de amanhã, mas há 50 anos, a ditadura militar chilena foi iniciada a partir do golpe militar realizado no país, no dia 11 de setembro de 1973, contra o então presidente Salvador Allende. E sei onde eu estava há 22 anos nesse mesmo dia e recordo-me porque estava prestes a meter-me num avião em Ponta Delgada para vir para o Porto e nas televisões do aeroporto só passava a colisão de aviões nas torres gémeas em Nova Iorque! A notícia era fresca. Tinha acontecido há 20-30 minutos…E eu fiquei num misto de não é possível até perceber que tinha mesmo acontecido e era absolutamente real…

Este post é apenas para me lembrar que a vida dá muitas voltas. As guerras, o terrorismo não acabam e as catástrofes quer sejam naturais ou por mão humana, mantém-se na atualidade. As mudanças são visíveis e até palpáveis, em países (que, agora, têm até nome diferente); as cidades mudam de papel… Roma engrandecida como império, também chegou a ser invadida e o meu Porto, já não é só conhecido pelo vinho, é também a porta de entrada de muitos turistas. E as pessoas, as pessoas também mudam e muito. A Terra tem milhões de anos, e cada um de nós, com sorte, passará dos 80 anos, pouco mais em alguns casos. Somos apenas e só um grãozito de areia neste mundo e assistimos sempre a coisa diferentes na nossa “época”, que não chega a ser “Era”. Talvez não consigamos mudar o curso do mundo. É impossível. Mas se neste pequeníssimo estado de tempo de passagem pudermos, mais uma vez, com sorte, ter uma vida boa e proporcionar uma vida boa, já terá valido a pena!

E já agora, apenas como nota: O Dia Mundial da Prevenção do Suicídio comemora-se a 10 de setembro. Este dia foi criado, precisamente há 20 naos, pela Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio e pela Organização Mundial de Saúde com o objetivo de prevenir o ato do suicídio, através da adoção estratégias pelos governos dos países. Assim, outra lição. Todos os dias são importantes!

03
Set23

Sabes, tia... isto é amor!

Maria Pinto

Tio R. hoje tenho pensado muito em ti. Muito. Tenho pensado na tua magreza. Nunca foste gordo, mas és quase um esqueleto. Bem sei que a tia Z. está doente. Está demente. Tem Alzheimer. E tu, como homem bom, seu marido, continuas como sempre ao seu lado, mas estás cansado, deprimido e também um pouco doente. Mas não demente. Apenas e só... abatido, desanimado, infeliz!!!

Ao pensar em ti, vários temas rondam a minha cabeça…o que é o amor verdadeiro? Talvez seja o que fica, o que respeita, o que dignifica, o que magoa, mas não se abandona. Penso nos cuidadores de pessoas que amaram e amam e que têm demência e sofrem demais num país, que dificilmente consegue apoiar os familiares nestas circunstâncias.

Penso na depressão. Fala-se tanto em doença mental, hoje em dia. Como não estar desesperado aos 80 anos quando se é o principal cuidador de uma pessoa com idade próxima que não se lembra de coisas do dia-a-dia, que faz sempre as mesmas perguntas, que persevera nos mesmos temas?

Como não estares angustiado pelo teu dia-a-dia? Como não estares deprimido porque a mulher com quem casaste há mais de 50 anos está a definhar? Como aguentar isto tudo?

Penso nas nossas férias em Tavira, eu criança. Irmos todos para a praia de Tavira ou Cabanas e termos momentos muito felizes e quando tento puxar mais a corda, lembro-me de uma ou outra noite, alguém dizer: “Z. canta lá um fado!” E a Tia Z. cantava um fado com todos nós, mesmos as crianças, calados, todos, a ouvi-la. A sua voz, o seu sorriso, as suas gargalhadas, o seu bom humor, a sua perspicácia…a sua beleza!

Tia Z…a última vez que nos vimos, há umas semanas, estavas tu no hospital, por teres dado uma queda a meio da noite…partiste o fémur. Fui ver-te e, como já estava à espera, não me conheceste, mas gostei tanto de te ver. Continuas bonita, apesar de magrinha e o teu sorriso é doce, mas os olhos perderam um pouco o brilho. Falaste comigo, surpreendida por te ir visitar. O discurso foi fluido, mas com pouco conteúdo. Quero-te bem!

Há uns anos atrás, num Natal em que fui a vossa casa, dizias-me que a tua sorte foi teres encontrado o R, tinhas tu 15 anos! Quantos amores há como o vosso? O teu R, aos 80 anos cuida de ti. Realmente tens muita sorte. Mas a última vez que o vi, ele revelou apenas ao de leve uma pequena lágrima no seu canto do olho quando lhe perguntei como estava…não precisou de dizer mais nada. Cheguei ao carro e fiquei também comovida. Por respeito, ele que te respeita e dignifica tanto, não chorou. Eu também não o ia fazer à sua frente. Mas, no carro, as lágrimas correram na minha face, livremente. Lembro-me bem do passado e vejo agora o presente. Honestamente, tento não pressentir o futuro, quando tu tia, não conheceres os que te estão muito próximos, mesmo o teu R.

Quando abordei a questão de centro de dia ou outras alternativas, o teu R. só me disse, "mas a tia ainda está suficientemente bem para se aperceber do que lhe faria"… Sabes, tia... isto é amor!

Este texto vale o que vale…apenas uma pequeníssima homenagem a duas pessoas de quem gosto muito e que sofrem por estarem a viver uma demência. Uma com ela e outro a cuidar dela. Deve ser tão, mas tão exasperante!

Gostaria que se pudesse dar mais resposta social a estas pessoas, aos doentes e seus cuidadores familiares, que sofrem diariamente e que, frequentemente, por vergonha ou receio, ou simplesmente, resignação, não pedem ou têm ajuda…

Portugal tem uma população cada vez mais envelhecida. A demência é uma realidade cada vez mais presente, por esse motivo.

Numa altura em que Portugal é o quarto país da OCDE com mais casos de demência por cada 1000 habitantes (21 casos), “parece-nos fundamental oferecer intervenções que promovam o bem-estar dos cuidadores informais”, conclui Soraia Teles. “Cuidar de um familiar pode ser gratificante e contribuir para sentimentos de utilidade e realização. Contudo, os cuidadores informais de pessoas com demência são uma prioridade porque estão em risco acrescido de vir a desenvolver depressão, ansiedade, hipertensão, problemas digestivos e respiratórios, quando comparados com a população em geral.”, explica a investigadora doutorada do ICBAS.

Para os doentes e seus cuidadores que haja mais apoio, mais abertura para que se consiga lidar com esta condição tão difícil!

- https://alzheimerportugal.org/  .Linha de Apoio na Demência: 963 604 626 – Chamada para rede móvel nacional (dias úteis das 9h30 às 13h00 e das 14h00 às 17h00);

- iSupport-Portugal é o nome do programa de apoio e formação online adaptado à população portuguesa pelo Instituto de Ciências Biomédicas Abel Salazar (ICBAS) da Universidade do Porto, com a colaboração do CINTESIS e da Associação Alzheimer Portugal, com o objetivo de apoiar os cuidadores informais de pessoas com demência.

28
Ago23

Às voltas com a vida!

Maria Pinto

Apesar de respeitar os seres humanos e admirar muitos deles, muitos, não consigo lidar bem com a palavra “idolatrar”. Soa-me a falsidade, a superficialidade, a baixa auto-estima, a uma certa pena…do próprio que idolatra. Como se não conseguisse atingir, por si, a grandiosidade do seu ídolo! Talvez aos olhos de muita gente esta minha definição seja errada. Concedo que sim. Mas, na realidade, é o que sinto. Eu adoro o meu pai e, acima de tudo, tento homenageá-lo e dignifica-lo, mas ele partiu e não o idolatro. E, tenho a certeza, que se vai manter sempre o meu mestre, mesmo já não estando cá, nesta Terra! Essencialmente era um ser humano. Repleto de virtudes e, como não poderia deixar de ser, alguns (penso que poucos defeitos. Bem sei que é a filha a falar!!!) Mas é também o que sinto!

E andando às voltas com a vida, vou refletindo, avançando e, por vezes, retrocedendo…

Dei comigo a ver algumas frases de pessoas e fui buscar algumas de 4 pessoas que admiro. Três delas nunca conhecerei e uma, provavelmente, nunca conhecerei também, pelo menos pessoalmente!

Quando por vezes ouço a questão: “Se tivesses a oportunidade de almoçar com alguém, quem escolherias?”

Automaticamente na minha cabeça aparecem 4 pessoas, e só estas! Curiosamente! Gosto muito de realizadores, atores, músicos, mas não penso, à partida nesses, penso nestes…

- Mahatma Gandhi:

“A força não provém da capacidade física. Provém de uma vontade indomável”

“Olho por olho, e o mundo acabará cego”! E é o que temos no início deste século!

“O fraco jamais perdoa: o perdão é uma das características do forte”...e já agora estou a tentar trabalhar o perdão…

- Nelson Mandela:

“Ninguém nasce odiando outra pessoa pela cor de sua pele, por sua origem ou ainda por sua religião. Para odiar, as pessoas precisam de aprender, e se podem aprender a odiar, podem ser ensinadas a amar”...e eu mais uma vez a martelar na tecla da educação!!!

“Bravo não é quem sente medo, é quem o vence”…tão verdade!

“Uma boa cabeça e um bom coração formam sempre uma combinação formidável” E o que dizer disto?

“Os tolos se multiplicam quando os sábios ficam em silêncio”…esta é intemporal! Cada vez me vou calando mais…parece que estou a ouvir o meu pai quando era miúda…”temos dois ouvidos e uma boca…o que achas que quer dizer?”

- Mantin Luther King Jr:

“Se um homem não descobriu nada pelo qual morreria, não está pronto para viver”. Isto é bonito mas é duro…acho que a maioria de nós se pensar a sério tem algum receio destas palavras!

“A verdadeira medida de um homem não se vê na forma como se comporta em momentos de conforto e conveniência, mas em como se mantém em tempos de controvérsia e desafio”. TOP!

“Eu tenho um sonho. O sonho de ver meus filhos julgados por sua personalidade, não pela cor de sua pele”!

E, finalmente,

- Papa Francisco:

“Deus não pertence a nenhum povo”...isto vindo de um líder religioso e espiritual. Que bonito!

“Engana-se quem acha que a riqueza e o status atraem inveja... as pessoas invejam é o sorriso fácil, a luz própria, a felicidade simples e sincera e a paz interior”

E para acabar em beleza, até porque gosto muito da palavra “esperança”, “Não deixe que ninguém lhe tire a sua esperança”!

E é isto!

Estas frases são extraordinárias. Não concordo com tudo o que disseram ou fizeram, mas com quase tudo!

Podiam até ser vários almoços ou lanches…mas parece-me que eu era capaz de aprender alguma coisa com estes quatro!

Ainda tenho a esperança de um dia vir a ser sábia!!!!!!! Já que pedir não custa, eu vou pedindo…sabedoria!

13
Ago23

Ir com o vento…

Maria Pinto

Após vários meses à espera de férias, lá vieram os dias de descanso e consegui aproveitar com calma e tempo o espaço dos dias e preenchê-los com sorrisos, gargalhadas, lágrimas (sim, também me comovi com os pequenos quês da vida) e silêncio (porque o silêncio é de ouro e assim como gosto muito de palavras e sons e, por vezes, barulho, também gosto do silêncio). Foi tempo de família, essencialmente! Ouvi música, li muito, conversei, vi filmes e séries e fui numa roadtrip, Espanha, França, não importam os sítios. Ou melhor, até importam, gostei muito do que vi e vivi, mas o que me solidificou, o que realmente me sustentou foi estar com a minha família e podermos viver estes dias a quatro!


Gostaria que as minhas filhas daqui a muitos anos se lembrassem destes dias como eu me lembro de ir com os meus pais para a minha adorada Tavira, cidade onde passava sempre a segunda quinzena de julho desde a minha infância até à adolescência. Dar mergulhos com o meu pai naquela praia maravilhosa da ilha de Tavira, depois de apanhar o barco e sentir a água do Gilão mesmo na face, recordar as bolas de Berlim, com creme e de comer gelados à noite, numa das esplanadas da praça principal. Ir de barco para Ayamonte (ainda não havia ponte) e comer tapas e ir buscar ao supermercado as bolachas príncipe e, claro, as rebajas!


Tenho saudades tuas, pai! Mas na minha memória vivem os imensos momentos que passamos juntos e, obviamente, as férias da minha infância vêm-me muito à ideia. Hoje estou assim, um pouco macambúzia…


Hoje é um dia nostálgico. Amanhã inicio o meu trabalho! É bom voltar, com saúde e com mais energia e ânimo depois de ter vivido semanas de descontração, mas há uma melancolia…há um querer ficar agarrada a estes dias…de não querer dizer adeus a esta sensação de liberdade, de não ter horários rígidos, de ir para onde se quer, sem dar satisfação a ninguém…ir com o vento…


Por muito que goste do meu trabalho, que bom é estar de férias! Que bom!

07
Ago23

O que significa ser boa pessoa?

Maria Pinto

O que significa ser boa pessoa?

Conseguimos encontrar, fazendo uma pesquisa na internet, várias definições/interpretações muito completas do que é ser boa pessoa.

No Priberam existem 19 alíneas para a palavra “bom” (não as coloco todas…):

“1.Que é como deve ser ou como convém que seja; que corresponde ao que é desejado ou esperado (ex.: ela é uma boa chefequeria comprar um bom carro)...

  1. Que tem ou demonstra bondade ou magnanimidade (ex.: fez uma boa acçãoé rabugentomas tem bom coraçãoo seu pai é um bom homem)…
  2. Que é ética ou moralmente correcto no seu comportamento ou nas suas atitudes (ex.: boa pessoabom carácter)…
  3. Que demonstra habilidade ou mestria na realização de alguma coisa…
  4. Que cumpre o seu dever ou demonstra eficiência na realização de algo (ex.: é considerado um bom médico pelos pacientes)...
  5. Que apresenta estado ou condições favoráveis (ex.: hoje o tempo está bom)…
  6. Que se caracteriza pela afabilidade, cortesia ou delicadeza (ex.: ela tem bom feitiohoje está de bom humor)…
  7. Que agrada ao paladar (ex.: esta sopa é muito boa)…
  8. Que foi produtivo ou rentável (ex.: boa colheitafoi um dia bom e fizemos muito dinheiro)…
  9. Pessoa que tem valor em alguma coisa ou que tem um desempenho com qualidade em determinada actividade (ex.: fizeram testes para separar os bons dos maus)…
  10. Pessoa que se considera ter uma postura moral correcta (ex.: os cristãos acreditam que os bons irão para o céu)…
  11. Expressão usada quando se quer encerrar um assunto ou introduzir um novo (ex.: bompassamos ao tema seguinte).”..

in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa [em linha], 2008-2023,

A que mais gostei foi: “Sinceridade, honestidade: agir com verdade e sem maldade sem interesses egoísta e maldoso apenas interesse em fazer o bem o certo, tendo sempre noção que não deve influenciar as vidas de ninguém, apenas acender a pequena luz ao fim do túnel, pois essa luz ira iluminar a vida da aqueles que estão as escuras.”

in dicionarioinformal.com.br

Porque resume, rapidamente, o que é uma boa pessoa. Gosto particularmente “…tendo sempre noção que não deve influenciar as vidas de ninguém”…isto é muito bonito, mas se perguntarem às minhas filhas, aposto (e ganho) que elas não só me acham muito chata como acham que, por vezes, sou insistente, teimosa, influenciadora e o meu marido já me disse que acha que sou controladora…a minha mãe acha que, por vezes, sou um general…portanto… ( o que dizer de mim como pessoa?) e “…apenas acender a pequena luz ao fim do túnel, pois essa luz ira iluminar a vida da aqueles que estão as escuras.” É precisamente por isto que faço o que faço e sou chata e controladora e teimosa e general!!!!!!!!!!!

Conheço excelentes profissionais que não são bons filhos ou bons pais ou bons amigos. Conheço excelentes mães que não são boas profissionais ou esposas. Conheço boas esposas, que não são excelentes mães, conheço boas filhas e boas mães que não são boas esposas ou noras ou tias, ou o que eu considero “boa pessoa”, e por aí fora… É muito difícil ser bom em tudo...diria mesmo, impossível!

Porque apesar de todas as definições possíveis que existem escritas, a mais importante é o que sentimos no fundo de nós mesmos… o sabermos o que é uma boa pessoa quando encontramos uma. Como é que nos sentimos? O que muda em nós? E, na minha opinião, é quando estamos perante alguém que nos faz dar o nosso melhor, que nos coloca um sorriso na cara, que nos faz andar para a frente, que nos alenta, motiva, incentiva, que nos faz feliz, que nos faz sentir bem com nós mesmos. Talvez isso sejam só bons amigos. O que disse caberia na definição de amizade!

Estes conceitos são sempre muito parciais e subjetivos. Uma pessoa que seja espezinhada no local de trabalho, se arranjar outro modo de vida em que vê sorrisos frequentemente no novo espaço onde labora, vai achar as pessoas, em geral, boas! E, etc… Nós somos, também, o resultado das nossas experiências. E todos temos definições /interpretações diferentes dos variadíssimos conceitos/temas, porque cada um e nós é único.

Hoje estou com este palavreado todo porque a vinda do papa ao nosso país, tem-me feito pensar em algumas coisas:

- a quantidade de pessoas que o papa move, deixou-me estarrecida! Mesmo! Quanta gente espalhada por Lisboa… (gosto muito da nossa capital, mas não queria viver lá nestes dias… (aonde está a minha boa pessoa?);

- são muitos os jovens que querem divertir-se, seguramente. Grande parte não irá pela fé, mas pelo convívio. O que não faz deles más pessoas! Mas assim como assim, há muitos jovens com fé e, de certa forma, isso deixa-me contente; Como uma espécie de esperança no futuro!

- será que estes jovens “bons” no presente, serão bons pais, filhos, marido/esposa, tios, sobrinhos, noras/genros, amigos, colegas, no futuro, depois de serem apanhados pela vida com tudo o que esta tem de bom e de mau?

- muitas pessoas que estão a ver o papa, ao vivo ou na TV, estão a querer vê-lo, mas não ouvem bem as suas palavras. Ou talvez, ouçam muito bem, mas não assimilem, ou assimilando, fazem-no por 2 ou 3 dias;

-que fiquei, frequentemente, comovida, com as palavras deste papa, tão sereno, gentil e humilde. Gostei muito duma frase que disse…qualquer coisa do género “…a única altura em que é aceitável olharmos para baixo para uma pessoa, é quando a tentámos erguer”! Isto é bonito. Como é bonito, quando diz que temos um caminho a percorrer e que a vida é esse caminho! Que o façamos com amor!

Não acredito que nos dias em que saio aborrecida do emprego, vou olhar com amor para o mundo quando está um trânsito terrível ou que vou conseguir perdoar quem não me respeita ou que vou ter sempre boas palavras e dar abraços fraternos. Não sou assim boa pessoa. Seguramente! Mas talvez, apenas talvez, tente ser sempre a minha melhor versão ao longo deste caminho e talvez isso já não seja pouco!

Vou ter dias bons e dias maus. Por vezes serei boa pessoa, outras nem tanto! Mas se tentar dar o meu melhor nas várias vertentes da vida, talvez seja um passo no sentido correto! Certo?

E já agora…olho para este papa e sinto no fundo de mim mesma, que é boa pessoa!

23
Jul23

Há cinema que é arte e há cinema comercial, que não é arte

Maria Pinto

Finalmente de férias! Os meus dias de descanso, tão esperados!


Logo no primeiro dia, decidi ver um filme que andava a adiar há muito tempo. Quando o vi pela primeira vez, há mais de vinte anos, achei-o um excelente filme! Há cinema que ainda é arte! Para mim, “O pianista” é uma obra de arte!


O argumento é fundamental para uma película. É o cerne da questão. Não interessa se os atores são fabulosos. Se a história não for boa, o filme não resulta.


E aqui temos a vida de um pianista polaco de ascendência judaica a tentar sobreviver da melhor maneira possível ao holocausto!


Gosto de filmes que mexem comigo. Daqueles filmes que no final nos deixam a pensar, que revolvem qualquer coisa dentro de nós. Este filme mexeu comigo! Um homem com posses vê-se privado da sua casa, deixa de trabalhar, tem de mudar de vida ao longo do tempo. Perde os seus bens e a sua dignidade. Vê e vive o que de pior há na essência humana. Como ficar indiferente a uma história assim? E se fosse eu, o que faria? Como me comportaria? O ser humano só se mostra verdadeiramente quando se encontra com os seus limites. A maioria de nós, não quer chegar a esse ponto! É um limiar muito perigoso! Mas por vezes, na vida, no meio do caos, da desumanização total, há uma espécie de milagre, que quase não conseguimos perceber e justificar como acontece. Como um raio de sol no meio de uma tempestade. A exuberância de um arco-íris. E este homem, que durante anos não pode tocar piano, a sua forma de arte, a sua paixão, consegue salvar-se porque o inimigo reviu nele um tipo de encarnação angelical. O som do seu piano, a maneira como tocou para o oficial das SS, foi de tal forma bela, que o fez escapar à morte!


As interpretações, principalmente do ator principal, Adrien Brody, são muito boas. A ele valeu-lhe um oscar. Conseguiu espelhar o desespero, a angústia, a quase loucura, pautada por uma resiliência e equilíbrio, fora do comum.


Vi o filme em minha casa, na minha sala, numa televisão comum, numa sexta de manhã.


No sábado à noite, fui ao cinema ver o último Indiana Jones. Num écran gigante com som alto e muita gente à minha volta! (Senti saudades do meu sofá e da minha TV, a sério!). E até gosto de ir ao cinema, mas não foi mesmo uma experiência para reviver!


Recordo-me do primeiro e do terceiro filmes, os que mais gostei, como uma espécie de filmes que pautaram a minha adolescência. Lembro-me da excitação de ver um filme de aventuras como os do Indiana Jones. Seguramente um herói para mim, há mais de trinta anos! Não apreciei tanto o segundo e, o quarto filme ficou bem abaixo das minhas expectativas. Já não era só um antropologista versátil e carismático a tentar fazer valer a História, com a aura que exibia nos filmes iniciais. O quarto filme já o achei muito comercial. Em boa verdade todos os filmes tinham efeitos especiais que à época eram demais, mas este último ficou tão hollywoodesco, tão artificial, que não vi bem o “Indy”. Vi um ótimo ator a dar o seu melhor, numa história que não chega a ser razoável e a perder-se nos efeitos “laterais” da película. Achei-o tão inverosímil! Teria sempre de o ver, mas esta sequela deixou-me um sabor meio amargo…


E à volta da história, mais uma vez, o nazismo. Aliás como em vários filmes da saga (o terceiro, de cinco!).


No dia em que fui a Auschwitz-Birkenau, apesar de ter sido em agosto, estava um dia cinzento, adornado com uns chuviscos fracos. Lúgubre, como o sítio! Quando entrei pelo portão principal, vi a tabuleta que dizia “Arbeit macht frei”, que significa o "O trabalho liberta-te"! Depois foi um sucessivo encontro com montes de malas, cabelos, óculos, etc. Fui com amigos, sem guia, e a maior parte do tempo, lembro-me, estávamos calados. Uma espécie de respeito por aquele sítio tenebroso, onde foram mortas e torturadas tantas pessoas! Quando entramos nos espaços das câmaras ardentes, senti o peso da História. Como também lá está escrito…mais ou menos por estas palavras: “É importante lembrar a História, para que algumas coisas não se repitam”.


E, curiosamente, dou comigo a ler um livro de Gunter Grass (já o tinha começado antes das férias), “A passo de caranguejo”, que também fala desta época da história, o nazismo e a vida na Alemanha, na altura do holocausto!


Não fiz por acontecerem, mas tudo parecia estar coordenado para que tivesse de ver e ler sobre este tema!


Inevitáveis os pensamentos/reflexões que me pairam na cabeça…


- há cinema que é arte e há cinema comercial, que não é arte;


- ir ao cinema é bom, mas, o que importa é o filme. Se o filme for bom, não interessa o sítio onde o vemos, maravilha-nos na mesma!


- que tipo de pessoa seria eu se tivesse de ter vivido naquela época do holocausto? Como seria se tivesse num campo de concentração? Como seria se fosse alemã?


- ... e que em circunstâncias algumas, se deve esquecer o passado. O mundo está muito diferente em muitas coisas, mas a malvadez humana existe. Espreita a todo o momento!


Anseio, nestes dias, ver muito mais cinema. Aqueles filmes que já não vejo há muito tempo mas que dominam as minhas memórias de outra idade em que aprendi a apreciar a sétima arte… como ”Voando sobre um ninho de cucos” e ”Amadeus”. Gostaria de os rever. Há muito tempo, muito, que os não vejo e, para além disto tudo, recordam-me o meu pai, que também gostava muito de cinema! O meu querido pai, que introduziu em mim os bichinhos da música e do cinema!

18
Jul23

Porque o caminho é para a frente!

Maria Pinto

Espero ansiosamente pelas férias! No último ano, foram muitas as mudanças e apesar de boas, foram algo cansativas! Tenho a certeza de que só conseguimos perceber o caminho quando, por vezes, olhamos para trás e refletimos. Há alturas em que olhando para o passado, ao refletirmos, percebemos de onde viemos, onde estamos e, provavelmente, para onde queremos ir. O caminho foi-se fazendo com muitas dúvidas, questões, cansaços, angústias, mas também com esperança e, acima de tudo, um sentimento de progressão, de realização.


Pensando no que deixei para trás, não foram só lugares, espaços, apartamento, trabalho, foram também pessoas. De umas tenho muitas saudades, mas são poucas. De outras, nada. Um nada imenso! Não me acrescentavam, descartei. Mas mesmo nisto, tenho de tirar algo positivo. Provavelmente foram elas também que me fizeram chegar a este ponto em que me encontro. Mais solta, mais leve, mais madura. Talvez também menos crente e mais fechada. As experiências que me fizeram passar, foram importantes para o meu crescimento. Não eram amigas, eram outra coisa qualquer e, agora, acho que foram fundamentais para o meu conceito atual de amizade. O meu conceito de companheirismo.


Neste meu caminho, que, espero, longo, quero apenas cercar-me de quem quero bem e quem me quer bem. O resto não importa. Ou pelo menos não é fundamental. São só relevantes para nos mostrarem as várias opções que temos na vida, e as estradas que queremos percorrer e com quem. Acredito que não podemos escolher propriamente o que a vida nos trás (não controlamos nada...), mas, provavelmente, conseguimos ter livre arbítrio de como queremos lidar com o que vem...


As subidas costumam ser difíceis. Já as descidas, são fáceis. Basta colocar um pé a jeito e lá caímos. Mas ainda assim, espero, que se tiver de cair, me levante ou então, que tenha alguém ao meu lado sólido, que me ajude a erguer. Porque o caminho é para a frente. E é sempre mais prazeroso com alguém de bem, ao lado!

09
Jul23

O poeta é um fingidor

Maria Pinto

O poeta é um fingidor.
Finge tão completamente
Que chega a fingir que é dor
A dor que deveras sente.

E os que leem o que escreve,
Na dor lida sentem bem,
Não as suas que ele teve,
Mas só a que eles não têm.

E assim nas calhas de roda
Gira, a entreter a razão,
Esse comboio de corda
Que se chama coração.

   Autopsicografia, Fernando Pessoa

Há uma poetisa em mim. Mas poetisa de alma, não de palavras, uma vez que ainda que escreva, não consiga fazer sobressair no papel tudo o que vai cá dentro. O poeta exímio, provavelmente, é aquele que faz um desvio rápido da cabeça e coração para a mão e quase não pensa no que está a sentir, apenas escreve e sai tudo de rajada e perfeitamente…Eu gostava de ser assim. Ideias… tenho muitas, mas quando as passo para o papel, tenho quase sempre a sensação de que não são tão perfeitas como eu as imaginava…

Comecei a escrever poesia talvez pelos 15 anos. Infelizmente já não sei onde estão esses papéis soltos onde libertava angústias e conquistava mundos…Soltava-me completamente das amarras impostas, principalmente por mim, no dia-a-dia e por alguns instantes era quem eu queria ser! Escrevia para aliviar medos, frustrações e, no fundo, para me libertar, para poder sentir que era eu, eu no meu mais profundo ser. Que pena tenho de não ter comigo esses poemas pueris, ingénuos, mas sentidos e chorados!

A vida foi andando e ainda que considere que tenho alma de poetisa não o sou. Um poeta tem de ter dor, tem de estar só. A solidão, a dor, o escuro, fazem com que consigamos libertar melhor as palavras. Esta é a minha opinião e, na realidade, quando vemos entrevistas a escritores, quase todos revelam que escrevem melhor sozinhos, no deserto social. Escapam-se para montanhas ou praias e ficam só consigo e as suas palavras e os seus pensamentos.

Assim, por um lado, não quero ser poetisa, porque no fundo acho que para o ser teria que sentir mais solidão e eu adoro estar com os meus. Não vou ser poetisa, mas contento-me com estes meus desabafos. Escrevo à velocidade do pensamento e apenas não rimo… Ao escrever, há uma parte de mim mais solta e que fica mais frágil porque já não estando dentro de mim, é passível de ser lida, ouvida e criticada… Mas eu sou a minha maior crítica… Quando acho que não estou a seguir o caminho melhor, paro e retenho-me… Não sou poetisa, mas escrevo para afogar mágoas e pensamentos e ideias e loucuras e manias!

Escrevo para dar azo ao meu coração, que é, frequentemente, tão racional…

Não poderia não deixar um dos poemas que mais gosto da poesia portuguesa! É absolutamente maravilhoso. Em tão pouco, diz tanto!

 

02
Jul23

Há já algum tempo que, voluntaria ou involuntariamente, tento meter a pandemia numa gaveta lá bem fundo da minha consciência.

Maria Pinto

Durante esta semana estive uns dias em casa por estar infetada com o SARS-COv 2. Felizmente, é raro estar de “baixa”. A última vez foi, precisamente, por ter tido Covid, remonta a janeiro de 2022! Ardor na garganta, mal-estar geral, um cansaço imenso e a febre. Maldita febre! Mas enquanto escrevo estas linhas, sinto-me bem melhor. E isso é o mais importante!


Mas com esta estadia em casa, parei e refleti.


Trabalho num hospital. Lembro-me de ver as imagens de mortes em Itália em fevereiro de 2020 na TV e ficar muito ansiosa com a possibilidade de aquele vírus demoníaco chegar a Portugal. Sabia que iria chegar, mas com que força? Havia um imenso receio da comunidade médica de que a onda fosse maior do que todos nós. E foi. Quando veio, atacou-nos bem. Não tanto como em Itália, mas atacou. Não posso falar pelos outros, mas digo-vos com honestidade, tive medo. Muito medo. Fazia urgências e o meu medo não era só visível, era palpável. Uma angústia imensa por saber que ia deixar os meus, para enfrentar algo, que nem sabíamos muito bem o que era e o que podia causar-nos. Nem me quero lembrar das sessões para vestir o equipamento. Primeiro até nem tínhamos equipamento todo, pelo menos no meu hospital e tudo era contado. As máscaras estavam num cofre! Havia receio generalizado de não haver material necessário. Também não quero ver outra vez na minha cabeça o vestir o equipamento, as horas intermináveis com o mesmo e eu, que uso óculos, com a viseira toda embaciada e aquela sensação de não se respirar bem com a máscara. Eu usava duas. A P2 por baixo e depois como me magoava imenso as orelhas, uma cirúrgica por cima, para aguentar e não ser tão desconfortável. E, com humildade, vos digo, não sofri muito. Trabalho com crianças e as urgências não foram péssimas. O medo instalado na sociedade em geral, fez com que os pais que, normalmente, com poucas horas de febre, levam as crianças ao SU, deixassem de ir com medo dos hospitais. E depois, claro, como houve confinamento, as crianças não ficaram tão doentes. Tenho colegas, que trabalharam em urgências de adultos muito pesadas e em enfermarias caóticas. Como conseguir manter algum equilíbrio com isto tudo?


O pessoal da saúde não parou (administrativos, auxiliares, técnicos, enfermeiros, médicos, etc...). E, acredito, que é a nossa vida, a nossa missão. Não estávamos com uma arma à cabeça quando decidimos a nossa profissão, mas também não nos disseram que poderia haver uma pandemia com estas dimensões. Não nos avisaram que poderia ser tão difícil. Não estou a falar só da parte física. Querer urinar e pensar duas vezes se queria mesmo despir e vestir outra vez o equipamento! Verdade! Estou a falar da vertente psicológica. Acreditem. Para muitos profissionais deixou marcas profundas. Ver morrer pessoas não é fácil, eo sentir-se impotente, é avassalador. Tive uma colega de ginecologia/obstetrícia que não viveu com o filho por 3 meses. Perguntei-lhe: “V. como consegues?”. “Tem de ser. Se eu lhe passar o vírus e acontecer algo, nunca mais me vou perdoar!”. Eu não consegui ficar sem a minha família. Tínhamos a nossa rotina. Depois de chegar a casa, mudar imediatamente a roupa, banho e se tivesse feito SU, durante 24-48 horas reduzir contato físico… E viveu-se, sobreviveu-se. E veio um segundo confinamento, e vieram as vacinas (felizmente!!!!) e veio, com o tempo, uma normalização da vida, de uma forma geral. Mas há histórias incríveis. Funerais em que os familiares não se puderam despedir do ente querido. Acho que tocou a todos, sem qualquer dúvida. Deixei uma perspetiva pessoal, senti medo e angústia e frustração, mas tocou-nos a todos. Todos! Quantas famílias não estão desfeitas por ter perdido entes queridos ou porque com a convivência, perceberam que tinham de se separar? Não tem sido tão incomum. O ser humano passou por uma espécie de tsunami. Em geral, sobreviveu, mas agora, vive de forma diferente…ou não!


Dou comigo, encarcerada no quarto porque não quero passar o vírus aos meus, e sei que a Covid, de momento, é uma constipação banal. Nas enfermarias juntam-se todos com ou sem Covid e lá se vive, sem equipamentos e máscaras e o terror que se tinha sentido!


O que é que aconteceu nestes últimos três anos? Pergunto-me com honestidade. Parece-me surreal. Não me esqueço do que vivi e senti (e não fui, de todo, a que teve piores experiências), mas, às vezes parece-me que foi só um sonho mau, um pesadelo. Há já algum tempo que, voluntaria ou involuntariamente, tento meter a pandemia numa gaveta lá bem fundo da minha consciência.


Hoje, bem melhor, sinto esta banal constipação (felizmente) sob uma perspetiva diferente. Aonde está o vírus demoníaco? Ele anda por aí. Desde maio anda em força e há muito Covid, mas agora, como já nem se fazem testes, tudo vai rolando. Nada contra. Já sofremos todos muito, para fazer testes e mais testes.


Mas queria apenas partilhar convosco esta minha reflexão. O ser humano, de uma forma geral, parece-me, consegue superar, tudo. Habitua-se a tudo. Dá a volta a tudo. Mas perdeu-se muito pelo caminho. O que aprendemos com esta pandemia? O que mudou verdadeiramente no ser humano em geral? Olhar assim por alto, nada! Parece-me que estamos exatamente iguais ao que eramos antes da pandemia. E atenção, o que estou a dizer é bom. Mas em que é que poderíamos ter melhorado? Na minha opinião, em tantas coisas!


Não sei o que nos reserva o futuro. Não sei se virá outra pandemia. Haja esperança!

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